Autocomposição.
Diz Emmanoel Campelo
Pereira de Souza - Coordenador do Movimento pela Conciliação –
CNJ:
"Segundo
o relatório Justiça em Números do Conselho Nacional de Justiça, a
cada ano, para cada dez novas demandas propostas no Poder Judiciário
brasileiro, apenas três demandas antigas são resolvidas. Some se
a este preocupante dado que se encontram pendentes cerca de 93
milhões de feitos. Sem dúvida, vivemos sério problema de déficit
operacional. Algumas das atuais soluções para esta delicada
situação deficitária envolvem preocupação essencial com o uso
racional e eficiente da máquina estatal. Isto porque
frequentemente,constatamos partes que, após longos períodos de
litígio, recebem integralmente o pedido posto na inicial, mas ainda
assim não sentem que “venceram o conflito”. Ainda mais quando a
vitória é parcial. Certamente se pode afirmar que, se uma parte
vence – parcial ou integralmente – uma disputa, mas ainda se
encontra insatisfeita ao final do processo, há algo no uso da
máquina estatal a ser questionado. A mera concepção de que um
conflito pode ser 'vencido' merece revisão. Em nossas relações
familiares privadas cotidianas, normalmente abordamos conflitos como
fenômenos a serem resolvidos – nunca se permitindo que um dos
cônjuges tenha a sensação de que saiu perdedor. Todavia, na nossa
prática profissional, permitimo nos o engajamento em
procedimentos elaborados para determinar qual o vencedor da disputa.
Para tanto, partes reciprocamente imputam culpa ou responsabilidade e
polarizam suas relações – como se um estivesse correto e o outro
errado. De fato, partes vencedoras de uma disputa frequentemente se
sentem perdedoras em razão do tempo, das custas e, principalmente,
da perda de vínculo. Este último item para muitos dos maiores
litigantes no nosso país é especialmente precioso, pois a perda de
vínculo com um consumidor envolve necessidade de dispêndio com
marketing para repor o cliente perdido e o prejuízo decorrente da
imagem da marca. Não restam dúvidas de que um litígio gera
adversários de grande animosidade e pode destruir as relações
entre os envolvidos. O mesmo pode ser afirmado em relação às
relações de vizinhança, parcerias comerciais, relações
bancárias e tantas outras que regularmente se encontram em armários
(e cada vez mais em discos rígidos) do Poder Judicário. Como bem
indicado pelo Min. Marco Aurélio Gastaldi Buzzi em reiteradas
palestras, faz-se necessário adotar novas práticas para uso
eficiente dos recursos materiais e humanos do Poder Judiciário. Esta
decisão envolve eminentemente nova cultura e novas políticas
institucionais: perceber que pode haver ganho com a participação em
mediações e conciliações, tratando estas como uma oportunidade de
crescimento, amadurecimento ou até mesmo para empresas como
marketing direto e de aproximação com o consumidor. Ganham os
envolvidos, que constroem suas próprias soluções satisfatórias;
ganham as famílias, que estabilizam seus sistemas familiares; e
ganham as empresas, que preservam seu maior patrimônio: o cliente.
Para tanto, faz se necessário ter uma perspectiva não
adversarial de uma disputa judicial. Perceber o consumidor como
adversário em um processo judicial induz a empresa a agir de forma
defensiva e até mesmo passiva quanto ao contexto apresentado pelo
autor (e.g. “os autores argumentam que prestamos esse serviço de
forma falha e nós contra argumentamos que o serviço foi bem
prestado”). Por outro lado, a criação de ambientes não
adversariais de resolução de disputas consiste em um dos maiores
desafios para esta política pública e para o próprio Poder
Judiciário. Isto porque esta mudança envolve uma mudança de
cultura. Frequentemente definida como “o software de nossas
mentes”, a cultura, para ser alterada, demanda amplo conhecimento
do ‘hardware’– no nosso caso a estrutura e vicissitudes do
Poder Judiciário e seus operadores –, bem como a criação de
estímulos para a mudança de cultura. Naturalmente, nova atualização
de sistema operacional para smartphone somente terá adesão se o
novo sistema oferecer algo que o antigo não possuía. Esta nova
visão ou nova cultura faz com que, empresas, por exemplo, passem a
perceber o consumidor (de forma não adversarial) como parceiro
essencial, mesmo em um processo judicial. Isso induz a empresa a agir
de forma construtiva e proativa quanto ao contexto indicado pelo
autor (e.g. “os autores argumentam que foi prestado um serviço de
forma falha e, como compartilhamos do interesse dos nossos clientes
de prestar serviços de excelência, gostaríamos de conversar sobre
formas de melhor atendê los”). A mudança de perspectiva
acima apresentada aplica se praticamente a todas as relações
conflituosas apresentadas no Poder Judiciário e requer treinamento
com o intuito de otimização dos resultados dos processos de
resolução de conflitos. Por este motivo, com o Movimento pela
Conciliação, criado em 2006, iniciou se amplo trabalho de
treinamento que tem neste Manual de Mediação Judicial relevante
apoio. Cabe destacar a atuação do seu organizador, o magistrado que
atualmente atua como Juiz Auxiliar da Presidência do Conselho
Nacional de Justiça, André Gomma de Azevedo, em razão da sua
generosa colaboração na organização e autorização de uso desta
obra, sempre sem nenhum custo ao Estado. Todavia, o maior apoio ao
Movimento pela Conciliação decorre do elevado número de
magistrados, mediadores, conciliadores, advogados, instrutores e
outros profissionais que já 'fizeram o upgrade de seus sistemas
operacionais' de cultura. Graças a estes valorosos profissionais, o
Poder Judiciário tem passado por mudanças significativas quanto à
sua função, adotando posição de ativismo também quanto à
orientação e educação do jurisdicionado, para tornar soluções
amigáveis de disputa uma prioridade de toda sociedade. Com isto, o
Poder Judiciário se aproxima de uma de suas mais belas funções:
educar a sociedade para tornar se mais consensual, ao mesmo
tempo em que enfrenta de forma direta um de seus maiores desafios: o
déficit operacional"
O
CNJ fez publicar MANUAL DE MEDIAÇÃO disponível no link:
http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/07/f247f5ce60df2774c59d6e2dddbfec54.pdf
A autocomposição é
um método de resolução de conflitos entre
pessoas e consiste em: um dos indivíduos,
ou ambos, criam uma solução para atender os interesses deles,
chegando a um acordo. Isso pode ser realizado por meio de criação
e/ou de divisão de valores,podendo-se fazer, ou não, um ajuste de
vontades entre as partes. Pode haver a participação de terceiros
(conciliador ou mediador) ou não (negociação e evitação de
conflito).
O
Novo Código de Processo Civil(2015) estimula autocomposição,
mesmo advinda dos primórdios da civilização,
continua existindo até hoje no direito brasileiro.
Inclusive, a autocomposição é fomentada pelas leis mais atuais no
Brasil, como a lei
de mediação e
o novo
CPC.
O NCPC, por oportuno, descreve que "a conciliação, a mediação
e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser
estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do
Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial".
Já
a
mediação, por exemplo, no parágrafo único da Lei Federal n°
13.140/2015, é considerada como "a atividade técnica exercida
por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito
pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver
soluções consensuais para a controvérsia".
No
Brasil temos hoje, a lei da mediação.
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Presidência
da República
Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos |
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Dispõe
sobre a mediação entre particulares como meio de solução de
controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito
da administração pública; altera a Lei no9.469,
de 10 de julho de 1997, e o Decreto no 70.235,
de 6 de março de 1972; e revoga o § 2o do
art. 6o da Lei no 9.469,
de 10 de julho de 1997.
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CAPÍTULO
I
DA
MEDIAÇÃO
Seção
I
Disposições
Gerais
§
1o Na hipótese de existir previsão
contratual de cláusula de mediação, as partes deverão comparecer
à primeira reunião de mediação.
Art.
3o Pode ser objeto de mediação o conflito
que verse sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis
que admitam transação.
§
2o O consenso das partes envolvendo direitos
indisponíveis, mas transigíveis, deve ser homologado em juízo,
exigida a oitiva do Ministério Público.
Seção
II
Dos
Mediadores
Subseção
I
Disposições
Comuns
§
1o O mediador conduzirá o procedimento de
comunicação entre as partes, buscando o entendimento e o consenso e
facilitando a resolução do conflito.
Parágrafo
único. A pessoa designada para atuar como mediador tem o dever
de revelar às partes, antes da aceitação da função, qualquer
fato ou circunstância que possa suscitar dúvida justificada em
relação à sua imparcialidade para mediar o conflito, oportunidade
em que poderá ser recusado por qualquer delas.
Art.
6o O mediador fica impedido, pelo prazo de um
ano, contado do término da última audiência em que atuou, de
assessorar, representar ou patrocinar qualquer das partes.
Art.
7o O mediador não poderá atuar como árbitro
nem funcionar como testemunha em processos judiciais ou arbitrais
pertinentes a conflito em que tenha atuado como mediador.
Art.
8o O mediador e todos aqueles que o assessoram
no procedimento de mediação, quando no exercício de suas funções
ou em razão delas, são equiparados a servidor público, para os
efeitos da legislação penal.
Subseção
II
Dos
Mediadores Extrajudiciais
Art.
9o Poderá funcionar como mediador
extrajudicial qualquer pessoa capaz que tenha a confiança das partes
e seja capacitada para fazer mediação, independentemente de
integrar qualquer tipo de conselho, entidade de classe ou associação,
ou nele inscrever-se.
Parágrafo
único. Comparecendo uma das partes acompanhada de advogado ou
defensor público, o mediador suspenderá o procedimento, até que
todas estejam devidamente assistidas.
Subseção
III
Dos
Mediadores Judiciais
Art.
11. Poderá atuar como mediador judicial a pessoa capaz,
graduada há pelo menos dois anos em curso de ensino superior de
instituição reconhecida pelo Ministério da Educação e que tenha
obtido capacitação em escola ou instituição de formação de
mediadores, reconhecida pela Escola Nacional de Formação e
Aperfeiçoamento de Magistrados - ENFAM ou pelos tribunais,
observados os requisitos mínimos estabelecidos pelo Conselho
Nacional de Justiça em conjunto com o Ministério da Justiça.
Art.
12. Os tribunais criarão e manterão cadastros atualizados dos
mediadores habilitados e autorizados a atuar em mediação judicial.
§
1o A inscrição no cadastro de mediadores
judiciais será requerida pelo interessado ao tribunal com jurisdição
na área em que pretenda exercer a mediação.
Art.
13. A remuneração devida aos mediadores judiciais será
fixada pelos tribunais e custeada pelas partes, observado o disposto
no § 2o do art. 4o desta
Lei.
Seção
III
Do
Procedimento de Mediação
Subseção
I
Disposições
Comuns
Art.
14. No início da primeira reunião de mediação, e sempre que
julgar necessário, o mediador deverá alertar as partes acerca das
regras de confidencialidade aplicáveis ao procedimento.
Art.
15. A requerimento das partes ou do mediador, e com anuência
daquelas, poderão ser admitidos outros mediadores para funcionarem
no mesmo procedimento, quando isso for recomendável em razão da
natureza e da complexidade do conflito.
Art.
16. Ainda que haja processo arbitral ou judicial em curso, as
partes poderão submeter-se à mediação, hipótese em que
requererão ao juiz ou árbitro a suspensão do processo por prazo
suficiente para a solução consensual do litígio.
§
1o É irrecorrível a decisão que suspende o
processo nos termos requeridos de comum acordo pelas partes.
§
2o A suspensão do processo não obsta a
concessão de medidas de urgência pelo juiz ou pelo árbitro.
Art.
17. Considera-se instituída a mediação na data para a qual
for marcada a primeira reunião de mediação.
Parágrafo
único. Enquanto transcorrer o procedimento de mediação,
ficará suspenso o prazo prescricional.
Art.
18. Iniciada a mediação, as reuniões posteriores com a
presença das partes somente poderão ser marcadas com a sua
anuência.
Art.
19. No desempenho de sua função, o mediador poderá reunir-se
com as partes, em conjunto ou separadamente, bem como solicitar das
partes as informações que entender necessárias para facilitar o
entendimento entre aquelas.
Art.
20. O procedimento de mediação será encerrado com a
lavratura do seu termo final, quando for celebrado acordo ou quando
não se justificarem novos esforços para a obtenção de consenso,
seja por declaração do mediador nesse sentido ou por manifestação
de qualquer das partes.
Parágrafo
único. O termo final de mediação, na hipótese de celebração
de acordo, constitui título executivo extrajudicial e, quando
homologado judicialmente, título executivo judicial.
A
disciplina da mediação extrajudicial
O
legislador ordinário disciplinou aspectos relacionados à pratica da
mediação extrajudicial, tais como prazos, formas de comunicações
e determinados requisitos para sua utilização. Certamente o
carácter pedagógico da lei não pode ser desprezado, porém,
especificidades como prazos relacionados ao procedimento
extrajudicial, aparentemente, não deveriam ter sido objeto de
disciplina legal. De toda forma, uma vez que a mediação
extrajudicial possui fundamento na autonomia da vontade das partes,
deve-se entender que tais especificidades poderão ser alteradas
consensualmente.
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